7 de ago. de 2004

Sturm und Drang

São gritos que me acordam de noite. Todas as noites. Um molho de chaves nas mãos e um charuto entre lábios sarcásticos. Se fosse a morte mostrar-me -ia a foice, mas sempre se esvai sorrateiro deixando escritos em minha porta:
"Sou só. Sôfrego e soturno a tua espera."
Suponho que possua as chaves do meu apartamento, e não sei porque me esquece na solidão fria dessas madrugadas. Esquivo-me observando pelo vão da porta o charuto que jaz aceso em meu carpete, deixo que as brasas se consumam desconhecendo qual saliva ou peçonha alimenta a chama; mas recôndita moro nessa fumaça - breu de amantes - neblina que me revela e se esconde.
É ele quem me acorda de noite. Todas as noites. E chama-me Pantera.
Estou debruçada sobre o parapeito de um vigésimo andar e a metrópole me enxenga imersa na penumbra desses dias que só anoitecem. Para mim é sempre noite, apenas o néon urbano me vem afligir as pálpebras enquanto finjo dormir. Ele está à porta, a minha espera, aguardando um sinal para que possa entrar. E eu aceno, dou ao chão guardanapos e versos, ele corre e suaviza a queda; rouba as minhas mãos e as cobre de beijos, descreve meus olhos e invade o meu sono. Ele é poeta, um doce aedo perdido numa estrada de desperdícios. Desceu de um carro azul em distintos trajes, com papéis e um molho de chaves nas mãos, um charuto entre lábios sarcásticos. Sarcásticos porque conhecem o meu desejo, a fúria da minha boca, o meu sexo, meu cio; e por isso grita, para que eu possa ouvir dentro de mim mesma. E eu ouço, ouço seus lábios soarem "Pantera...", ouço o toque lascivo em meu ventre como dedos ágeis bolinando teclas em êxtase, e ouço o meu rio se derramando na palma esquia de um desconhecido aedo. Perco-me em suas digitais agora:
"Sou só. Sôfrega e soturna a tua espera."

Nenhum comentário: