3 de out. de 2005

Está na hora de fazer alguma coisa pelos que não querem fazer nada

Detesto trabalhar. Acho desnecessário, degradante e abominável. Um castigo divino que se abateu sobre minha cabeça. Não devo ter sido um bom menino em vidas passadas. E, como punição (veja só a tragédia pessoal) fui condenado a passar toda a minha vida adulta trabalhando para me sustentar. É triste mas não precisa chorar. Não quero sua compaixão. Sou adulto e sei muito bem o que devo fazer: nada, claro. Sou um coçaholic convicto.

Mas conheço muita gente que tem a péssima, a ultrajante mania de trabalhar obsessivamente. Me irrita de um jeito! É uma compulsão que não é sadia. Uma doença que só se cura com repouso absoluto. Gostar de trabalhar? Tenha a santa paciência. Esses indivíduos pervertidos apresentam claros sinais de insanidade. Sociopatas que além de se matar de trabalhar, ainda conseguem arranjar um tempinho para patrulhar quem não fez nada para eles. Para esses intolerantes xiitas do labor, fazer nada é crime. É por isso que o coçaholic jamais assume sua condição. Nunca sai do armário funcional com medo de não ser compreendido, de ser hostilizado, agredido. Pior: tem medo de ser descoberto e ter de finalmente trabalhar de verdade. Bate na madeira! Mas não precisa ser agora. Mais tarde.

Onde está o direito à escolha? À democracia? E curioso: o coçaholic nem minoria é. Uma imensa horda silenciosa cujo único desejo é poder viver com dignidade e conforto sem precisar pegar no batente. Será que é pedir muito?

Se você acha que nunca viu um coçaholic é porque talvez esteja trabalhando demais. Bem-feito, quem mandou? Somos muito discretos, silenciosos e inativos. Somos a favor da livre-iniciativa, mas preferimos mesmo a não-iniciativa. Tomamos 350 cafezinhos por dia e lemos todos os jornais logo que chegamos ao escritório. Por isso o coçaholic é sempre muito bem-informado. Afinal, temos que ter assunto para nossas conversas intermináveis.

Nosso maior aliado é o computador, que nos oferece nossa mais importante ferramenta de trabalho: o jogo de paciência virtual. O coçaholic joga paciência o dia inteiro e aos olhos dos outros e principalmente do chefe ainda fica com fama de que trabalha muito. Chega mais cedo que todo mundo e vai embora mais tarde. Só pra jogar paciência. Agora então que existem alguns jogos que se disputam pela internet, a legião de coçaholics está muito mais unida, interligada, com know-how, talento e expertise, preparada para os cada vez maiores desafios dos jogos virtuais. A internet, aliás, é outra excelente ferramenta. Simulando pesquisas profissionais, podemos ficar o dia inteiro em salas de bate-papo ou sites de sexo. Todo coçaholic, por definição, adora ficar na rede. Falar ao telefone também é uma atividade fundamental na vida do coçaholic. Horas, horas e horas discutindo importantes, complexos e estratégicos assuntos de cunho pessoal com amigos que torcem sinceramente para que dê tudo certo. Como é importante a força dos amigos nesses momentos.

Conclamo, portanto, a todos os que têm aversão à labuta para lutar juntos pelos nossos direitos. Se bem que lutar pelos direitos dá uma preguiça danada. Vamos fazer o seguinte: vocês vão na frente que eu vou logo em seguida. Já, já.

Henrique Szklo escreve no Blônicas todas as sextas e por isso está muito cansado. Leia seu site e o blog da mãe.

Um comentário:

Ju disse...

Enfim uma voz lúcida em meus ouvidos!